top of page

Sérgio Povoa: “A empresa precisa aprender que ela pode ainda ser frágil”

Acervo pessoal - Sergio Povoa
Acervo pessoal - Sergio Povoa

Bom, vou falar um pouco de mim. Sou carioca, mas estou em São Paulo há 20 anos. Fui adotado por esta cidade e estou feliz aqui. Sou casado com o Nelson e tenho uma filha, a Mônica, de 18 anos. Há quatro anos, ela mora com a gente.

Comecei minha carreira como faxineiro. Não digo isso para me vangloriar por hoje ser diretor, mas porque gosto de compartilhar que sou alguém que faz rápido o que é chato para ter mais tempo de fazer o que realmente gosta. Minha carreira inteira foi construída com base nesse processo.

Limpava com agilidade os banheiros, a mobília e o chão e usava o tempo que sobrava para aprender o que o pessoal fazia nas máquinas, já que a minha primeira oportunidade de trabalho foi em uma indústria.

Acervo pessoal - Sergio Povoa
Acervo pessoal - Sergio Povoa

As minhas promoções aconteceram naturalmente porque demonstro a ânsia que tenho por aprendizado. Se me perguntam se quero aprender algo novo, me jogo de cabeça. Também dei sorte de estar no momento certo e na hora certa.

De faxineiro, passei a office boy e, frequentando o escritório, fui promovido para a área de finanças. Mais tarde, fui convidado a ingressar na área de tecnologia. Não sabia muito bem como funcionava, mas resolvi estudar e me tornei programador, depois desenvolvedor e, finalmente, migrei para a área de RH.

Quando entrei no RH, decorei todo o manual interno. As pessoas chegavam na minha sala, tinham dúvidas e eu respondia muito rápido. Se falavam que precisavam de um aumento e eu via que o salário já estava estourado na faixa, respondia de pronto que não dava, sem tentar entender a motivação do pedido.

Só que o RH não é uma ciência fechada, onde você responde somente sim ou não. É preciso considerar o fator humano e ter empatia. Então, um dia, minha gestora me falou: "Sérgio, você não serve para a área e vai voltar para finanças. Você está muito fechado em processos". Foi frustrante porque eu estava gostando muito do RH.

Pus a mão na consciência e pensei comigo: eu não sou assim! Só achava que estava fazendo o correto. Pedi para ficar em RH mais uns três meses e falei para ela que, se não visse mudança em mim durante este tempo, poderia me mandar embora.

Mudei e foi perceptível. Essa transformação foi decisiva para o meu crescimento profissional na área, que me levou à passagem por empresas tradicionais como a Souza Cruz, Unilever, GE, Areva (empresa francesa) e a J Macedo, do ramo alimentício.

Acervo pessoal - Sergio Povoa
Acervo pessoal - Sergio Povoa

Da indústria fui para o varejo como GPA e Rede Dia e empresas tech como Netshoes e OLX. Nesse meio tempo, comecei a atuar como se fosse um mentor de executivos de empresas. Além da minha formação como desenvolvedor, já havia estudado Administração e feito uma especialização RH e em Negócios.

Da Rede Dia fui para a Jamef Transportes, onde estou hoje. A Jamef é uma empresa que se destaca no mercado em um setor complexo, que precisa pensar na saúde mental do colaborador, no cuidado com o motorista que está sozinho na estrada e na responsabilidade de trazer a mulher para o protagonismo.

Ainda bem que a gente encontra pelo caminho riquezas como o Vez & Voz para criar uma tendência de inclusão. Acabei me envolvendo muito em assuntos de equidade e diversidade, principalmente quando conheci o movimento, e acredito muito nessa parceria.

Quando cheguei na Jamef, estávamos com 13% de mulheres na liderança; hoje, temos 42%. As coisas estão avançando. Uma das primeiras iniciativas que implementei quando cheguei na transportadora foi a equiparação salarial entre homens e mulheres que ocupam o mesmo cargo.

Acervo pessoal - Sergio Povoa
Acervo pessoal - Sergio Povoa

Minhas pessoas recrutadoras também foram treinadas para não perguntar à candidata mulher, em um processo seletivo, se ela tem filhos e com quem iria deixá-los, porque nós não costumamos fazer esse tipo de pergunta para um homem.

As empresas tomam decisões com base no gênero da pessoa, sem dar, de fato, a chance para que as profissionais digam “quero” ou “não quero”. Para um homem, não existe isso, você oferece a vaga e ponto. Na Jamef, estamos mudando essa realidade.

Parecem nuances pequenas, mas são mudanças de comportamento que fazem com que a mulher participe do processo seletivo de outra forma. Não tem problema que ela tenha filhos, ela já sabe o horário de expediente, de entrada e saída e isso é o que importa.

Quando a gente fala de mulher no transporte, não é porque estamos querendo levantar uma bandeira, mas é porque a diversidade para o ambiente de trabalho faz diferença. Está provado que resultados melhores são alcançados quando você tem diferentes pensamentos em uma organização e o gênero contribuiu para essa pluralidade.

Não encontro muitas pessoas que falam assim: – não acredito na pauta da equidade porque é moda. As pessoas acreditam, só que falta o pragmatismo de fazer, porque dá trabalho. Tem que ter vontade para fazer. E não é um compromisso só do RH. Os CEOs, o conselho e os acionistas têm que comprar a ideia.

Em uma das empresas por onde passei, contratei uma pessoa preta porque tinha o perfil da vaga e eu gostei da pessoa, e ele montou uma equipe de trabalho e colocou mais quatro pessoas pretas lá.

Aí o executivo falou comigo assim: “Sérgio, você viu que ele colocou mais quatro pessoas lá iguais a ele?”

Respondi: “mas a gente tem 800 pessoas brancas e você nunca veio falar comigo a respeito. Por que quatro pretos estão incomodando?”

E ele me disse: “você tem razão, me ajuda, que eu estou enxergando o mundo de maneira errada”. E quantos de nós também não estamos assim?

A questão é que toda a empresa precisa aprender que ela ainda pode ser frágil. Que ela não sabe lidar com uma pessoa que anda de cadeira de rodas ou uma pessoa transsexual e que é preciso aprender.

Tenho a sorte de estar em um ambiente onde as pessoas estão abertas para essas mudanças. Porque conforme você vai aprendendo, vai transformando a organização, a sociedade e o mundo.

Ah, e como não paro, estou no segundo ano de psicologia – em breve, contarei novidades dessa nova jornada!


Sérgio Povoa é diretor de Gente e Gestão na Jamef e vice-coordenador do movimento Vez & Voz.

Kommentarer


O movimento Vez & Voz é uma iniciativa do SETCESP - Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região.

A reprodução de conteúdos é permitida desde que citada a fonte.

Logo SETCESP branco.png
bottom of page